Lei Magnitsky: decisão do STF gera incerteza e derruba mercados, mas o momento exige calma e serenidade

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Por: Monte Bravo
21/08/2025 • 5 mins de leitura

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O acirramento das tensões relacionadas à Lei Magnitsky no Brasil foi surpreendente, pois aguardava-se uma solução negociada pelo Ministro Zanin, do STF.

Diante da decisão inesperada e fora do processo que examina o tema, as ações dos bancos caíram fortemente na terça-feira (19) enquanto a percepção de risco subiu e fez o dólar e os juros dispararem.

A despeito do aumento da tensão, recomendamos cautela e serenidade sem movimentos abruptos nas posições e nas carteiras.

Há um entendimento de que os bancos preservam a prerrogativa de recusar, ou restringir contas, devido a questões de compliance — uma prática corriqueira e aceita que protege as instituições de situações que geram risco financeiro ou de imagem.

Apostando em uma acomodação das tensões, não vemos necessidade de alterar o cenário econômico e tampouco a sugestão de alocação. Acreditamos que os bancos e o STF construirão uma solução de consenso que não fira a soberania do Brasil e que preserve a saúde do sistema financeiro nacional.

O que aconteceu

Na segunda-feira (18), o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, proferiu uma decisão que rapidamente se tornou o epicentro de uma crise com reflexos diretos no mercado financeiro. A medida, tomada no âmbito de uma ação relacionada às tragédias de Mariana e Brumadinho, suspende a eficácia de decisões judiciais estrangeiras que não tenham sido “incorporados ou obtido a concordância dos órgãos” previstos pela Constituição Federal.

Embora o caso original tratasse da possibilidade de municípios e estados brasileiros ajuizarem ações judiciais no exterior, o mercado interpretou a decisão como uma tentativa de blindar autoridades nacionais contra a aplicação da Lei Magnitsky para sancionar o ministro Alexandre de Moraes.

A reação foi imediata. Na terça-feira (19) o Ibovespa caiu mais de 2%, puxado por fortes perdas nos bancos. O dólar disparou, atingindo a marca de R$ 5,50, enquanto os juros futuros voltaram a subir.

As consequências

A decisão de Dino antecipou uma discussão que estava sob responsabilidade do ministro Cristiano Zanin, relator de uma ação movida pelo Partido dos Trabalhadores que pede à Corte que proíba os bancos de aplicarem a Lei Magnitsky no Brasil. Zanin havia solicitado manifestação da Procuradoria-Geral da República e pretendia ouvir todas as partes antes de se posicionar.

O debate parece mal focalizado, pois não há a pretensão de que a Lei Magnitsky se aplique fora dos EUA, ou seja, não está em discussão a extraterritorialidade da lei ou a soberania jurídica do Brasil. O que a Lei Magnitsky determina é que pessoas físicas e jurídicas sujeitas à jurisdição dos EUA, não podem ter relações comerciais com os sancionados.

No que diz respeito à situação de Moraes, bancos brasileiros com operações em dólar ou negócios nos EUA não podem simplesmente ignorar a sanção imposta, sob pena de sofrer retaliações que poderiam, no limite, inviabilizar as atividades.

O uso da Lei Magnitsky para punir Moraes foi uma medida arbitrária, sem lastro no espírito da lei, cuja instrumentalização sofreu oposição interna nos EUA e está sendo contestada. O problema é que as instituições financeiras brasileiras podem ficar diante de uma escolha de Sofia entre sofrer sanções que colocam em risco sua solidez financeira ou desobedecer ao STF. Por isso, na terça-feira, os maiores bancos do Brasil perderam quase R$ 42 bilhões em valor.

Segundo outras fontes, a intervenção do ministro Flávio Dino foi vista como precipitada e gerou desconforto. Segundo a imprensa, um magistrado afirmou que o ministro Dino “tomou a decisão de forma isolada, mas o reflexo é indissociável”, o que “atrai novas críticas, dessa vez do mercado financeiro”.

O colunista Walter Maierovitch, no UOL, foi ainda mais incisivo: “O ministro Flávio Dino ([..] ultrapassou suas atribuições jurídicas ao tentar blindar Alexandre de Moraes […]  Um juiz decide nos limites do processo. O caso era sobre Mariana e envolvia uma mineradora e um banco. Esse era o limite. O que isso tem a ver com a Lei Magnitsky? […] Dino deu uma decisão monocrática de conteúdo político e fora dos autos. Como pode uma decisão do Dino, monocrática e que não tem repercussão geral? Simplesmente ela é um indicativo da posição pessoal dele. Não estou defendendo a Lei Magnitsky em território nacional. Essa lei é arbitrária, vingativa e não se aplica a Moraes. Isso é uma coisa; outra é a decisão do Dino e o carnaval que ele está proporcionando”.

O que esperar

A escalada das tensões provocada pela decisão extemporânea do ministro Flávio Dino surpreendeu o mercado e reacendeu um dilema já presente nas áreas de compliance dos bancos. Embora a medida não revogue nem limite as sanções dos Estados Unidos dentro de sua jurisdição, ela cria obstáculos à sua aplicação automática no Brasil.

Isso significa que indivíduos sancionados, como o ministro Alexandre Moraes, continuam sujeitos a bloqueio de ativos, restrições de visto e proibição de transações com norte-americanos. Mais importante, a decisão não impede sanções secundárias contra instituições que, mesmo cientes da designação, viabilizem transações significativas com os sancionados.

Nesse contexto, a prerrogativa de encerrar contas por risco reputacional permanece nas mãos das áreas de compliance. Essa prática já é comum em casos envolvendo pessoas politicamente expostas ou suspeitas de lavagem de dinheiro e jamais foi contestada.

Ontem (20), os ministros do STF voltaram a receber representantes de bancos. O ministro Cristiano Zanin voltou a se reunir com Rodrigo Maia, presidente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras, nesta semana, enquanto aguarda o parecer da PGR para dar andamento ao recurso que trata diretamente sobre a Lei Magnitsky.

Segundo o Estadão, a intenção do ministro é buscar uma saída negociada com o sistema financeiro, evitando que os bancos se antecipem e criem uma situação que possa ser vista como antagonizando o STF.

Os bancos seguem tentando construir formas de cumprir leis brasileiras e ao mesmo tempo não desrespeitar as leis norte-americanas e já consideram encerrar contas, segregar saldos e bloquear cartões.

No entanto, é evidente que essa abordagem impõe complexidade jurídica e custo político às instituições financeiras — e reacende o debate sobre os limites da soberania nacional em um mundo cada vez mais interconectado.

Nosso entendimento permanece sendo de que a decisão de encerrar ou restringir contas é uma prerrogativa das áreas de compliance dos bancos. As instituições financeiras têm autonomia para avaliar o risco reputacional e decidir manter, ou não, uma relação comercial.

Essa prática é comum e amplamente aceita no ordenamento jurídico brasileiro, especialmente em casos envolvendo pessoas politicamente expostas ou suspeitas de envolvimento em atividades ilícitas — como lavagem de dinheiro.

O que a decisão do ministro Flávio Dino pode impedir, caso venha a se consolidar como entendimento majoritário do STF, é que esse tipo de encerramento de conta seja feito automaticamente com base exclusiva na aplicação da Lei Magnitsky.

Assim, a decisão não impede os bancos de agirem, mas estabelece que não podem fazê-lo em função de leis de outros países e que precisarão justificar suas decisões com base em critérios internos de compliance ou decisão de negócio. O desafio, portanto, não é jurídico, mas político e operacional.

No fim das contas, os bancos estarão diante de uma escolha difícil: enfrentar o risco de sanções internacionais — que podem comprometer suas operações e acesso à financiamento global — ou excluir um ministro do Supremo Tribunal Federal por razões de compliance. É uma equação delicada, com implicações que vão muito além da lógica comercial.

Um executivo de banco resumiu assim: “Vamos supor que venham novas sanções. Se o Supremo autorizar, ok, ficamos quites com o Brasil e com o exterior. Mas se o Supremo disser ‘não faça’, o que vai acontecer? Um banco que descumpre as sanções da OFAC não tem como sobreviver”.

A soberania nacional é um valor fundamental. Mas há outras coisas a considerar em um mundo interdependente onde fluxos financeiros, cadeias produtivas e sistemas jurídicos se entrelaçam. A defesa da soberania e dos interesses brasileiros exige cálculo estratégico e paciência. Humores inflamados e respostas não articuladas não combinam com uma abordagem diplomática.

Diante desse cenário, é imperativo que os atores envolvidos respirem fundo, analisem a situação com frieza e adotem uma postura estratégica. A marcha da insensatez se não contida pode transformar uma disputa jurídica em uma crise sistêmica com consequências negativas para todos os brasileiros.

Por:

Alexandre MathiasLuciano CostaBruno Benassi
Estrategista-chefe
da Monte Bravo Corretora
Economista-chefe
da Monte Bravo Corretora
Analista de Ativos
CNPI: 9236
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